AQUELA FIGURINHA DO CORTE DE ENERGIA ELÉTRICA

Sabe como é verão no Rio Grande do Sul, não? Famílias inteiras rumam para o litoral em dezembro e só voltam pra cidade depois do carnaval. Quando lembram das contas pra pagar, dão uma fugida numa segunda-feira qualquer para a capital, pagam as contas que estiverem na caixa de correspondência pra na terça-feira já estar de volta à praia debaixo de um guardassol e besuntado de sundown 30 olhando o mar cor de chocolate mas com a consciência tranqüila por estar com as contas em dia.

Minha figurinha Elizete faz parte desta turma, que primeiro curte a vida e depois se preocupa com as coisas chatas. Quando voltou de umas férias destas, pegou as contas na caixa de correspondência e... Opa! Aviso de Corte de energia elétrica, mas ela mesmo havia pagado. Foi direto na caixa de sapato forrada com um papel contact florido e a etiqueta “contas pagas”. Dezembro? Paga! Fevereiro? Paga! Dezembro? Paga! Oh, não! Dezembro paga duas vezes e janeiro nenhuma!

Elizete correu pro telefone, um zero-oitocentos, tecla aqui, tecla ali, atendente. Virgínia, uma simpatia. Explicou como proceder e garantiu que sua energia não seria interrompida. Alívio. Imagina a vergonha? Os vizinhos ficarem sabendo que estava “sem luz” por falta de pagamento.

Mais tranquila, Elizete vai regar as plantinhas na frente de casa quando um caminhão da companhia de energia elétrica estaciona bem na frente de sua casa.

- Bom dia, moça. Eu vim para cortar...

A adrenalina invadiu todos os vasos sanguineos de Elizete que não ouviu mais nada.

- Mas não vai cortar, mesmo! Acabei de falar com a Virginia e ela disse que não viriam cortar...

- Mas eu tenho ordens e vou cortar!

- Não vai! Eu faço um escândalo! Eu chamo a Zero Hora!

O escândalo já estava feito. A vizinhança inteira estava na frente de sua casa querendo se enfronhar do assunto. Maior bate-boca. Corta, não corta, corta, não corta.

- Mas minha senhora. Se eu não cortar, os galhos da árvore se enrolam nos fios e podem provocar um curto-circuito e deixar todo o bairro sem energia elétrica.

Silêncio.

- Aaahh! É a árvore?

- Só uns galhos... Não é a árvore inteira!

- Então pode cortar.

 

Deu as costas pra o funcionário da companhia de energia elétrica numa rabanada.
Elizete ouviu uma salva de palmas antes de entrar na casa e só soube que era pra ela três dias depois quando teve coragem de sair de casa. Ficou conhecida como a "vizinha verde", aquela que se preocupa com o meio-ambiente.
Algum tempo depois mudou dalí para um apartamento no centro da cidade.