quinta-feira, 19 de abril de 2012

AQUELA FIGURINHA QUE FALAVA DORMINDO

Meu pai era uma figuraça. Não peguei seu tempo de boêmio em que tocava e cantava na noite porto-alegrense na Orchestra Imperial, naqueles bailes dos anos 50,  mas ouvi muitas histórias.  Casou-se com minha mãe, dona Etelvina, uma linda mulher de olhos verdes ardosiados, cheirando a Rapture ou Charisma, os perfumes da Avon, que ela mesmo vendia de porta em porta. Ele um mulato escuro, cabelo escovinha, vaidoso, malandro...  Quando acabaram-se as orquestras de baile, o lado de industriário teve que se sobressair, mas o boêmio continuava a existir... então ele saia da metalúrgica onde trabalhava e ia se encontrar com os amigos no bar do Sindicato dos Metalúrgicos onde cantava serestas pra alegria dos frequentadores... chegava em casa com chuletas de baixo do braço ou aquela linguicinha fina pro jantar e contava suas histórias.
Quando criança, dividia o quarto com o irmão mais velho. Casa antiga, humilde, com o banheiro na rua... algumas vezes mijavam na cama e fatalmente apanhavam no dia seguinte. Numa madrugada fria, meu pai teve uma vontade louca de fazer xixi, mas lembrando da surra que poderia ganhar e o frio que fazia na rua não teve dúvidas. Levantou de sua cama quentinha e mijou na cama do irmão e voltou pra sua cama seca e quente. Adivinha quem apanhou na manhã seguinte?
Rapazote, queria parecer mais velho, aumentar o volume do bigode... não teve dúvidas, pegou um lápis de cor e passou no bigode e saiu feliz da vida crente que estava agradando devido aos sorrisos e olhares que recebia. Mas ele não devia ter confiado na sua visão que o enganou à luz do candeeiro da sua casa, porque ao invés de pegar um lápis preto, pintou seu bigode com um lápis roxo.
Eu não sei se lembro de ver ou te terem me contado. Uma vez ele chegou em casa com um trofeuzinho de campeão do jogo de escova, (ou escopa), se vangloriando, esnobando... minha mãe afastou os pratos da mesa e disse: pega o baralho que vou te mostrar quem é campeão.  Deu uma “surra” de escova no velho que ele foi obrigado a entregar o troféu pra ela.
Outra passagem tem a ver com o ilícito jogo do bicho. Meu pai contou que sonhou com gatos que caiam do telhado e jogou no numero do gato e chegou em casa furioso que o numero não chegou nem perto. Contou pra minha mãe o jogo e o sonho e ela disse:

- Gato que cai do telhado não é gato, é burro... que bicho deu?
- Burro, respondeu ele...
- Dois burros, né, Jota (apelido do meu pai), tu e o do jogo do bicho.

Meu pai falava dormindo. Minha mãe tinha altas conversas com ele, geralmente ele falava dos colegas da fábrica de pregos, dos amigos de buteco... Reza lenda, que numa madrugada ele acordou minha mãe com seu sonilóquio, dando risadinhas irônicas e falando de um tal “Barriguinha”

- O Barriguinha... hehehe... o Barriguinha é um safado. O Barriguinha é um sem vergonha...
- É, Jota? Porque?
- Porque que o Barriguinha é um sem vergonha? Porque ele tem uma namorada em cada esquina. O Barriguinha não presta!
- Mas quem é o Barriguinha?
- O Barriguinha? Hehehe o Barriguinha sou eu!

O coitado acordou com os supapos, tapas, socos e sendo empurrado pra fora da cama sem entender o que estava acontecendo. Não tinha como explicar. Parece que continuou o sono no sofá da sala.
Assim era seu Jota, meu pai, que durante o dia assistia o Sitio do Pica Pau Amarelo e a noite, dormindo, contava as peripécias da Emilia... 
Ô saudade danada!

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

AQUELA FIGURINHA QUE FICOU 100 DIAS NO HOSPITAL

A figurinha sou eu mesmo. Depois de uma síncope cardíaca no verão de 2010 passei uma boa temporada no mesmo hospital em que trabalho. O que foi bom, afinal conheço todos os médicos, enfermeiras, técnicas o que me rendeu um atendimento VIP.
Eu nunca me senti um moribundo, nem mesmo o tempo que estive na UTI, esta o tempo todo consciente, rindo e brincando e reclamando do barulho da madrugada até que minha médica disse: "Para de rir, Fernando. Cai na real... tu quase morreu!" Foi aí que comecei a pensar na minha vida, repassando como se fosse um filme. A trilha sonora é ótima, mas acho que não teria chance de levar um Oscar. Vidinha "mais ou menos" a minha, mas é a MINHA vida e acho que to vivendo certinho.
Tive tempo de pensar muito nas situações que estava vivendo lá dentro e que me ajudaram e encarar com bom humor. Só estou publicando porque uma amiga disse que vale apena, Caetano já disse que é melhor filosofar em alemão. Se filosofei ou não, eu não sei digam voces mesmos.




“ Eu vi a morte bem de pertinho. A minha sorte foi que ela não me viu.”

“ Hospital tem dois lados: o de dentro e o de fora, procure ficar do lado de fora.”

“ Meu nome é Fernando mas depois do CDI (Cardio Desfibrilador Implantável com ressincronizador) podem me chamar de Cyborg.”

“Meu nome é Fernando mas depois do CDI podem me chamar de Brainiac.”

“ É como se eu tivesse ganho um Grande Prêmio e não soube usar, por isso me tiraram... “

“ Daí me devolveram o Grande Prêmio... “

“ Como a gente lembra dos amigos numa cama de hospital. Como a gente lembra dos amigos! ”

“ O ressincronizador implantado no peito vai me impedir de passar pelas portas giratórias dos bancos. Meu dinheiro lá dentro e eu aqui fora... Já viu, né? “

“Sei que teve gente fazendo novena, despacho, falando com espíritos pra eu ficar bom. Isso deu uma briga lá no céu! Mas parece que deu certo.”

“ Cheguei a fazer um inventário das minhas coisinhas...
mas o que eu tenho já é de todo mundo, desisti. “

“ Voces não tem ideia da importância de um banho
de chuveiro. Fique vinte dias tomando banho no leito
pra entender o que significa. “

“ Fazer cocô num vaso sanitário, por mais sujinho
que ele seja, é uma dádiva. Só quem fez cocô em cumadres
por tanto tempo sabe. “

“ O pior de tudo é ter estas técnicas em enfermagem, que parecem modelos, limpando tua bunda suja de cocô. “

“ Elas limpando e a gente com cara de cocô. “

“ E elas olham o pinto da gente naquele estado lastimável. E não adianta dizer: ‘ Hei! Ele não é sempre assim!’ “

“ Com que cara a gente olha pra elas depois? Cara de Cocô! “

“ Sempre visite um amigo no hospital, seu rosto vai alegrar seu amigo por muito tempo. “

“ Quando tu resolver ter uma síncope, procure um local bem macio. “

“ Jamais perca os sentidos quando estiver sozinho. “

“ Descobri que todos os dias podem ser domingo ou segunda-feira, nunca sexta ou sábado. “

“ Aquela história de que ‘uma maçã por dia mantém o médico longe’ não é verdade... quanto mais maçãs eu como
mais médicos aparecem.”

“ Incoerência servirem tantas maçãs num hospital... “

“ Deve ser para fazer companhia aos médicos-bananas. “

“ Minha alimentação deve ser sem sal.
Mas onde está escrito que tem que ser sem tempero? Alho faz bem à saúde, pimentão é legume entenderam?

“Meu nome é Fernando mas depois do CDI podem me chamar de Homem-de-Lata.”

sábado, 5 de novembro de 2011

AQUELA FIGURINHA DO "EU TE CONHEÇO?"

As vezes a gente se mete em cada saia justa! Homem ou mulher, é saia justa mesmo! Acontece sem aviso, em qualquer lugar, com qualquer pessoa e com uma certa freqüência... To falando de encontros inesperados, como pessoas inesperadas, inusitadas e as vezes desconhecidas, pelo menos pra um deles... sabe aquela morena que te olha no corredor dos produtos refrigerados no supermercado, te dá aquele sorriso, larga o carrinho e vem em tua direção de braços abertos pra te dar um abraço e diz teu nome com uma intimidade assustadora, tu sabe que conhece e tu não faz a menor idéia do nome da pessoa, sabe que conhece, sabe que são amigas, mas com se chama? Maria... não o nome não casa... Celeste? Não não é Celeste... e ela sempre falando, pergunta pelo teu irmão pelo nome, pela tua mãe chamando de tia, mas não é tua prima... até o nome teu cachorro ela sabe... aliás, esta é a cara que tu fica... cara de cachorro que lambeu sabão.  Ok, ta frio naquele corredor, melhor se despedir e dizer pra ela te ligar qualquer dia pra tomarem um chá... Tu sabe que a cara dela vai ficar projetada em seu subconsciente por vários dias até que tua mãe chega quase um mês depois e te diz: “A Heleninha disse que te encontrou no supermercado outro dia...” Ah, a Heleninha... ex-vizinha que se mudou há quinze anos, emagreceu dez quilos e pintou o cabelo de castanho...
E quando tu confunde a pessoa? Tem certeza que é o Toninho, que fez a faculdade contigo, e ele afirma que não é Toninho, que se chama Sérgio e tu continua dizendo que ele namorava a Vilma, que tinha um fusca Pink... O cara se irrita, diz que não conhece nenhuma Vilma, te manda pra bem longe e fica tu, outra vez, com cara de cachorro que lambeu sabão. E quando te confundem com outra pessoa?

- E aí, Júnior?
- Mas eu não sou o Júnior...
- Grande Júnior... sempre brincalhão! Aparece lá em casa!

Isso já aconteceu comigo, contigo, mas o que aconteceu com esta minha amiga, que vou denominar Si, está aquém da saia justa.
Ela foi numa festa com alguns amigos, e como era a motorista da vez ela estava totalmente sóbria, principalmente porque a EPTC estava pegando pesado com a lei seca bem nos bairros boêmios como o Cidade Baixa e Calçadinha da Fama no Moinhos de Vento.
Então, fim de festa, Si sai do pub com sua turma e do meio de um outro grupo sai um cara, bem vestido, relativamente bonito e a chama por nome e sobrenome: - Simone Ferrão! (Oops! Escapou!) Ela olha pro estranho com uma cara de espanto tipo “deondeestecarameconheceai” mas o que sai é:
- Nossa, tu sabe meu nome todo.
E ele continua:
- Sei teu nome,onde tu mora, tenho teu MSN, Orkut e Facebook...
Ela só pensou num hashtag ; #fudeudirceu – Mas quem é este cara? O estranho só olhava pra ela e ria, e provocava, e trollava sem dizer quem era. E deixando-a curiosa, furiosa por perder sua memória, despediu-se, sem mais nem menos.
No caminho pra casa esqueceu as blitz espalhadas pela cidade e  tentava ligar aquela fisionomia a um nome qualquer, precisava saber quem era o cara que usava aparelho ortodôntico nos dentes inferiores. Nem ouvia o que seus caronas e hóspedes conversavam.
Chegou em casa e foi direto ao computador, ligou, praguejou pela lerdeza da máquina e acessou o Face e começou a procurar aquele rosto entre seus amigos.
Fixou-se numa foto e chamou seu hóspede.
- Foi este aqui o cara que me cumprimentou na saída do pub?
O amigo olhou, coçou o queixo, tirou a boina e coçou a cabeça...
-Olha, Si... não sou muito bom fisionomista, mas eu acho que foi este mesmo.

Ela soltou uma gargalhada porque foi uma coisa que muitas mulheres gostariam de fazer deliberadamente e ela fez sem querer.

- Por que a risada?
- Porque se era este o cara, era o meu ex-marido!

domingo, 3 de abril de 2011

AQUELA FIGURINHA DO PERFUME FEDORENTO E OUTRAS PÉROLAS

Lembra quando a gente comprava pacotinhos de figurinhas e na hora de abri-los torcia pra que viesse aquela figurinha pra completar uma página? De preferência aquela “mosca-de-cabeça-branca”, rara, única, que ninguém da turma tivesse. Jenifer (leia Djenifer) é uma destas figurinhas. Eu não acredito que exista na face da Terra uma outra figurinha como ela. Totalmente do bem, sempre disposta a ajudar, a dar uma mão, a mostrar-se prestativa as vezes em assuntos que ela nem domina... Eu to enrolando porque não tenho nenhuma história de Jenifer que se crie uma situação pra contar, mas são pequenas situações, soltas, espontâneas cuja primeira impressão que se tem é “hein?”, a segunda: “ela disse isso que eu entendi?”, a terceira: “eu não acredito que ela esteja fazendo isso!”

Uma bela manhã recebo uma ligação de Jenifer convidando para almoçar com um amigo em comum da Bahia que chegou pra conhecer a cidade. Nem vou mencionar o fato de ela ter me passado o endereço do restaurante errado. A idéia era levá-lo aos museus, casa de cultura, fazer um lanche numa lancheria popular, mas logo no inicio do passeio percebemos que alguém tinha exagerado no perfume, mas não foi bem isso, Jenifer havia ganho um perfume de uma marca barata e a tampa do vidro quebrou dentro de sua mochila espalhando 300ml de um aroma floral enjoativo e repugnante que era impossível ficar perto dela. Éramos como aquela gatinha fugindo de Pepe Le Gambá. Pra completar, dentro da mochila ela tinha uma canga (nem me pergunte porque alguém tem uma canga dentro da mochila em uma cidade que não tem praia) que fizemos ela colocar na primeira lixeira do caminho. Tive a impressão de ver a lixeira derreter. Enfim...

Começa aquela chuva de verão, típica de Porto Alegre, subimos num ônibus onde as pessoas tinham as janelas fechadas por causa dos chuviscos, mas tão logo entramos no coletivo, os passageiros não se importaram em se molhar e abriram as janelas. Chegamos na casa de uma amiga onde ela se viu obrigada a lavar a mochila, mas parece que esta máquina de lavar deixou todasas roupas que eram lavadas ali com o perfume de Jenifer por três dias.

Mas Jenifer não é do mal, muito pelo contrário, e toda do bem, espontânea, alegre, fala sem pensar, por compulsão, quase sem respirar e os assuntos escapam de sua boca e isto a mete em muitas confusões. Gosta de falar de pessoas que tu não conhece e nunca irá conhecer, e conta casos com todos os detalhes deixando o assunto principal em segundo plano até que esquece o que queria dizer.

Fomos com uma galera passar um final de semana na praia e nos divertimos muito mas Jenifer protagonizou um dos momentos mais engraçados, que ecoam até hoje. Falávamos de protetor solar. Conosco estava um amigo muito branquinho que pediu um com FPS 50 e ela veio com a explicação de que os filtros com FPS acima dos 30 o efeito não é muito diferente que usar um de 30. Alguém perguntou a ela: - Quem disse isso? E ela respondeu com toda a ingenuidade que os deuses lhe deram.

- Um amigo químico meu!

Só ela não percebeu a cacofonia com que nos brindou. Falei que não era necessário ficar dizendo o que o amigo havia feito com ela, que sua intimidade não nos diz respeito, e “e o amigo que te comeu, entende mesmo de filtros solar?” Rimos muito e começamos a arranjar novos amigos pra Jenifer. O amigo cômico dela. Ou o amigo físico dela.

Mas ela não parou por aí... numa nova reunião de amigos o assunto era o bairro onde cada um morava. E todos sabem que ela mora num lugar muito afastado do centro da cidade, e começamos a chamar de interior, de “grotas”, de sítio... e ela um tanto quanto indignada levanta, na vã tentativa de por fim na questão.

- Por favor! Não falem mal do meu buraquinho!

Houve um silêncio de três segundos pra que todos caíssem na gargalhada de mais uma pérola de Jenifer.

E por favor, nunca esqueçam a pronuncia: DJENIFER... e desde então todo o Jorge é Djorge, todo Genival é Djenival e assim vai ad infinitum.

Mas esta é a nossa Jenifer, a mala preferida da galera, mesmo sem costura, e sem rodinha.























terça-feira, 22 de março de 2011

AQUELAS FIGURINHAS DO AUTÓGRAFO

A primeira vez que eu lembro de ter ouvido Legião Urbana foi ali no Bom-Fim, no Bar Escaler, meados dos anos 80. Acho que estávamos eu, Jair, Vinicius, Ricardo e Danilo, talvez mais alguém, talvez menos um... Paramos ali pra tomar uma cerveja, matar tempo pra ir ao cinema ou qualquer outra festa. Quando resolvemos sair dali, uma frase saída das caixas de som do bar nos impediu: “Não vá embora, fique um pouco mais...” Era um tal de Renato Russo implorando nossa presença. Nos olhamos, demos uma risada e sentamos pra tomar mais uma cerveja. E acabamos ouvindo todo o LP. LP, sim! De vinil. Estou falando dos anos 80.

No dia 02 de julho de 1988 eles fariam o primeiro show em Porto Alegre, no Gigantinho. Ingressos comprados. Agora não tinha volta, tínhamos que ir.

É claro que no dia do show já sabíamos todas as músicas do disco de cor e salteado. Talvez “Geração Coca-Cola” fosse nosso hino informal. Sem o Google era difícil pesquisar o que era Baader Meinhoff mas a música simplesmente mexia comigo, mexia conosco, mexia com o Brasil inteiro, enfim...

Não lembro com detalhes do show... mas lembro que não parei de cantar, pular dançar em nenhum minuto... Tá... quando tocaram “Por Enquanto” o ginásio deu uma acalmada e foi quando percebemos que o show tava terminando e tínhamos que ir “de volta pra casa”.

Estávamos na Brasília marrom do Danilo, aliás, uma Brasília guerreira que protagonizou muitas histórias da galera. Estacionamento lotado, estomago roncando. Resolvemos comer alguma coisa e esperar aquela horda deixar o Gigantinho e pegar o carro quando o estacionamento estivesse mais vazio. Não tínhamos pressa.

Comemos não lembro o que e nem sei onde mas foi ali nos arredores do Beira-Rio. Quando chegamos no estacionamento foi fácil localizar a Brasília marrom, e o trafego na avenida Padre Cacique tava bem mais tranqüilo. Tanto que na primeira sinaleira que pegamos fechada, um ônibus azul com o logotipo da promotora de eventos que havia trazido a Legião Urbana pra Porto Alegre, parou do nosso lado. Ricardo se deu conta e conseguiu por trás de Danilo, que dirigia, sair pela janela e bater na janela do ônibus onde Renato Russo estava. O cara cumprimentou Ricardo, na boa. O sinal abriu e não tivemos escolha se não seguir o ônibus.

O ônibus azul, com os cupidos da Opus, parou em frente ao Hotel Plaza São Rafael e nós estacionamos logo atrás.

Paramos na porta do hotel sem saber exatamente o que fazíamos ali... a equipe, os roadies e o resto da banda passaram por nós e mal cumprimentaram, mas Renato não. Renato parou e ficou conversando conosco o maior tempão. Perguntou o que achamos do show, se tínhamos o disco, perguntou da cidade, até que uma menina pediu um autógrafo. Ele prontamente assinou na agenda dela... E nós não tínhamos agenda, não tínhamos caderno, não tínhamos um bloquinho... Eis que Danilo tira uma nota de cem mil cruzeiros da carteira, aquela com a efígie do Juscelino e desenhos de Brasília, e entrega a Renato que diz:

- Este autógrafo vai sair caro!

O ingresso pro show deve ter custado entre sessenta e oitenta mil cruzeiros e valeu cada centavo, o lanche não faço nem idéia quanto custou mas o papo com o líder da banda do momento e o autógrafo numa nota de cem mil cruzeiros não tem preço.

Isso aconteceu realmente. Talvez eu tenha esquecido algum detalhe, talvez eu tenha colocado um detalhe a mais mas é um fato que as figurinhas do meu álbum nunca esquecerão. E ta aí a memorabilia pra confirmar o que eu digo.


domingo, 19 de dezembro de 2010

AQUELA FIGURINHA DA CAMINHADA

Ela nasceu em Minas Gerais, quase lá na Bahia, passou a maior parte de sua vida em São Paulo, mas casou-se e veio viver em Porto Alegre. O que faz dela uma mineirinha quietinha, uma baiana porreta, uma paulista batalhadora e uma gaúcha que não leva desaforo pra casa! Assim é a Maria, Mara para os amigos.
Aquela história de que todas as mulheres precisam emagrecer pelo menos dois quilos é levada a sério por ela. Tanto que todas as manhãs ela se vestia pra dar a sua caminhada matinal e só depois ia para o trabalho.
Fazia seu exercício diário matinal numa praça perto da sua casa, ali na Plínio e com elas, donas de casa, aposentados, patricinhas... e como era muito cedo, o movimento na rua era bem pequeno. As pessoas recém estavam saindo para o trabalho, faculdade e escola e no inverno, seis ou sete horas da manhã parecia noite. E a neblina deixava a praça com um ar londrino.
E foi numa manhã assim que Mara sentiu que um cara em uma moto a seguia, mas poderia estar seguindo o sentido da rua também... ela acelerou o passo na tentativa de alcançar um casal que caminhava a sua frente mas não conseguiu. Quando dobrou numa das esquinas da praça onde seria contra-mão para o motoqueiro ele subiu o calçamento e passou a segui-la bem devagarzinho. Mas ela entendeu o que ele queria.
Diz ela que ele repetiu várias vezes “ – Me dá o teu celular!” mas ela dizia que não ia dar, que se ele quizesse que fosse pegar e jogou no meio de uns arbustos e começou a jogar pedras, paus e o que tinha pela frente em cima do motoqueiro que ainda foi até os arbustos pra ver se encontrava o aparelho. Sem sucesso, o motoqueiro atravessou a praça, pegou a avenida e sumiu no trânsito. O casal que caminhava a frente de Mara assistiu mas não se envolveu... Comentavam do perigo que era caminhar cedo da manhã no inverno enquanto estava escuro, e que não tinha mais hora pra fazerem assaltos, Enquanto isso Mara procurava o seu aparelho celular nos arbustos. Encontrou a bateria, o capinha e logo depois o aparelho, sem danos. Colocou o aparelho de volta na cintura, tomou o caminho de casa com raiva e decidiu não completar o circuito que determinou pra si como se fosse o ideal.
Em casa, após o trabalho, contou pra todo mundo o ocorrido, e todos recomendando cautela, que deveria ter uma esteira ergométrica em casa, ou se matricular numa academia, que não fosse mais sozinha...
Analisando friamente a situação perguntei pra Mara:

- Tem certeza que ele queria o aparelho? Ele não estava te paquerando e pedindo apenas o numero do teu celular?

Ela afirma que não. Mas fez-se um silêncio entre os participantes da conversa seguido de uma gargalhada geral.
Mas nunca saberemos...

sábado, 13 de novembro de 2010

AQUELA FIGURINHA DA PERERECA

Uma das casas em que morei em Porto Belo era enorme. Tinha quatro quartos, uma sala grande, cozinha e uma garagem que era toda a extensão da casa e cabia bem uns três carros. Tudo a cinqüenta metros do mar e no pé de um morro e na avenida principal da cidade. E eu morei ali sozinho.
Parece o paraíso, né? Seria se não fosse uma casa velha e caindo aos pedaços, de madeira, com goteiras e sem nenhum móvel... Mas era o que eu tinha... mesmo porque eu ia só pra dormir. Tinha um ótimo colchão de casal, ganhei um fogão vermelho de 4 bocas, uma caixa de isopor que fazia as vezes de geladeira e tudo o que não tinha mais serventia pra vizinhança e que não queriam mais, tipo: mesa, cadeiras, armários, me davam de presente. Quando me dei conta estava com uma casa montada.
Quando alguns amigos me ligaram de Porto Alegre perguntando se tinha lugar pra ficarem eu dizia que a casa era bem grande mas que deveriam levar colchonetes e roupas de cama que o resto a gente dava um jeito.
Foi um dos verões mais animados, recebi a visita de Danilo, Bonnie e Karen num dia, e Laís e Luciane no outro. Carnaval! Calor...
Esqueci de dizer que por morar no pé de um morro e bem próximo da avenida onde tinha um arroio que levava água da chuva pro mar me trazia visitas de muitos animaizinhos como passarinhos, lagartixinhas, sapinhos e pererequinhas. Não! Eles não entravam em casa, ficavam na área da garagem... nos fundos da casa... Só que eu tinha uma perereca de borracha muito parecida com uma de verdade e meu passatempo era assustar as meninas. Consegui assustar todas uma vez, mas a Laís... Sempre.
Toda vez que eu colocava a perereca de borracha no caminho da Laís ela levava um puta susto! Na pia do banheiro, na pia da cozinha, debaixo dos lençóis dela em qualquer lugar que fosse, pá! Um grito da Laís.
Perdeu a graça. Me distraí com outras coisas e parei de assustar a minha amiga.
Estávamos todos na cozinha jogando ou fazendo alguma coisa em grupo e Laís resolveu lavar a louça, preferiu usar a pia da garagem e ficava ao lado da churrasqueira por ter mais espaço. Lavou o primeiro prato e quando foi depositá-lo no escorredor de louça, quem estava agarradinha nas grades de inox? A perereca! Laís pensou em gritar, mas controlou-se e disse pra si mesma que não me daria o gostinho de ouvi-la gritar outra vez... Enquanto lavava a louça, preparava sua vingança contra mim.
Quando colocou o último talher no secador, Laís resolveu pegar a perereca pra dizer que não tinha mais medo e aparecer na minha frente com ela na mão. Grande erro! Quando ela pegou a perereca, e sentiu aquele corpo mole, lisinho, viscoso...

Foi quando ouvimos dois gritos igualmente assustadores. Um já conhecidíssimo e potencializado pelo medo era o de Laís que estava num canto da garagem com os olhos esbugalhados, o coração querendo saltar pela boca e os cabelos totalmente arrepiados e o outro era da perereca que ao ser tocada pela humana soltou um grito agudo, dolorido, de pavor e pulou pro outro canto da garagem, era uma scinax fuscovarius, uma pererequinha de banheiro, inofensiva, de hábitos noturnos e um pavor enorme de humanos. Desde aquela noite ela não mais apareceu. A perereca e não Laís, minha amiga, porque depois que ela ouviu os primeiros acordes do samba enredo da Mangueira, ela esqueceu perereca, esqueceu medo, esqueceu susto, esqueceu tudo...
Mas eu não esqueci esta história, e precisava passar adiante.
Como eu disse foi um verão muito divertido, mas não fiquei naquela casa tempo suficiente, mas no inverno seria um cenário bem legal para um filme de terror...