quinta-feira, 21 de outubro de 2010

AQUELA FIGURINHA DO VIOLÃO

Conheci esta figurinha na mais improvável das situações: prestando o serviço militar. Meu xará, soldado Fernando. Claro que a gente não se tratava assim, eu chamava pelo nome e ele pelo meu sobrenome para evitar as possiveis confusões que nomes iguais poderiam causar. Como no dia em que liguei para a, então, namorada dele e foi dificil explicar que eu era o outro Fernando., mas isto é uma outra história. O fato é que ficamos amigos dentro e fora do quartel de comunicações. E o que aconteceu fora é que se tornou mais interessante. Ele era estudante de música, respirava música, comia música e, modestamente, sempre se dizia “estudante de música”. Deve dizer isso até hoje enquanto professor de harmonia na mesma faculdade em que estudou. Fernando me fez gostar de música erudita, me ensinou a curtir Bach, Vivaldi, Beethoven, discutíamos sobre MPB, rock do inicio anos 80. Assistímos juntos um ciclo de cinema alemão no Instituto Goethe. Confesso que as vezes me sentia meio que um pombo entre os gatos indo aos recitais no Instituto de Artes, afinal, eu não entendia bulhufas, mas mesmo assim eu ia, não tava nem aí. Até hoje, quando posso, dou uma fugida nestes recitais. Continuo sem entender, apenas gosto ou não gosto.

Uma vez, Fernando me ligou falando de um Duo Italiano que se apresentaria no Theatro São Pedro e que os ingressos eram grátis, mas teriam que ser retirados no consulado italiano, que por acaso ficava no mesmo prédio em que eu trabalhava. Desci e peguei os ingressos para o mesmo dia. Sairia do escritório, faria um lanche e sobraria tempo até a hora do espetáculo. Se...

Se Fernando não tivesse ligado outra vez dizendo que estava com dois violões e pedindo para me encontrar com ele no Instituto de Artes pra ajudá-lo com os instrumentos. Prontamente. Da Praça da Matriz onde eu trabalhava, até o IA era uma “pernada”, mas tudo por um amigo. Eu poderia ficar sem o lanche, na boa.

Saímos do prédio do IA cada um carregando um violão devidamente dentro dos estojos e fomos caminhando pelo centro da cidade. Otávio Rocha, Rua da Praia, General Câmara... Nem lembro sobre o que conversávamos mas devia ser algo relacionado a musica, ao espetáculo, alguma exposição... Quando, finalmente, adentramos ao Theatro São Pedro, cada um carregando um violão, um grupo de senhoras com seus vestidos de domingo (lembro perfeitamente que uma delas usava um vestido azul cheio de brilhos e um trazia sorriso simpático no rosto) se aproximou de nós dois falando italiano. Eu fiquei atônito, mas Fernando dizia: “ – Non capice niente! Non capice niente.” Até que alguém disse em portugues: “ – Voces são músicos?” Com toda a presença de espírito Fernando conseguiu responder: “ – Sim, somos, mas não os que vocês estão esperando...”

Foi muito engraçado. Eu não conseguia parar de rir, Fernando dava explicações, os italianos nos rodeando sem entender o que estava acontecendo e neste meio tempo os verdadeiros músicos entravam no teatro sem ninguém para recepcionar.

Desfeito o mal entendido, sorrisos amarelos, a senhora de azul nos conduziu até a chapelaria para deixarmos os dois violões, verdadeiros pivôs do incidente. Até esqueceram de pegar os dois ingressos de minhas mãos. Eu tinha eles guardados até pouco tempo feito uma memorabilia... da situação em si, não do duo, não do recital.

Não lembro o nome dos músicos, mas lembro que o espetáculo foi muito legal e naquele dia, de carregador de violão, me transformei num músico italiano.

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